“Esta não é a vida para você.” Estas palavras ajudaram um homem que trabalhava no tráfico de drogas a se tornar um ativista comunitário e capturam os objetivos do novo relatório da Equimundo, “Esta não é a vida para você.” Masculinidades e Não Violência no Rio de Janeiro, Brasil.
O relatório, produzido pela Equimundo para Cidades Seguras e Inclusivas (SAIC) programa global de pesquisa, apresenta os resultados de uma adaptação do International Men and Gender Equality Survey (IMAGENS) no Rio de Janeiro. Revela novas descobertas sobre gênero, masculinidades e trajetórias não violentas no contexto da violência urbana, incluindo as interações entre a violência nas esferas pública e privada.
O título do relatório foi inspirado na história do homem mencionado acima, morador de uma favela no Rio de Janeiro. Ele explicou, durante uma entrevista qualitativa, que as palavras "Esta vida não é para você" vieram de um colega de seu grupo de tráfico de drogas enquanto o observava brincar com uma criança. Logo depois, ele deixou o tráfico e se tornou ativista. Ele foi um dos 45 entrevistados nas entrevistas qualitativas em profundidade do estudo, além de mais de 1.151 que participaram das entrevistas quantitativas, realizadas na cidade do Rio de Janeiro entre 2013 e 2016.
O estudo constata que homicídios e outras formas de violência persistem em níveis elevados em favelas e outros ambientes de baixa renda no Rio de Janeiro e – como muitas pesquisas já demonstraram – essa violência afeta predominantemente homens jovens, negros e de baixa renda. A pesquisa inclui entrevistas com entrevistados de duas amostras, correspondendo aproximadamente à zona sul da cidade, onde as taxas de homicídio são mais baixas, e à zona norte, onde as taxas de homicídio são mais altas.
Os resultados mostram que a exposição dos homens à violência urbana antes dos 18 anos está fortemente ligada ao uso posterior de violência – incluindo violência de gênero – na vida adulta. Uma média de 82,81 TP3T dos homens entrevistados havia sofrido ou testemunhado pelo menos duas das seguintes situações antes dos 18 anos: agressão agravada, tratamento violento pela polícia, espancamento, troca de tiros, casa ou local de trabalho atingido por balas, ameaças de morte ou ser alvejado por arma de fogo.
Ao mesmo tempo, quase 951 TP3T dos homens entrevistados tinham uma visão positiva da posse e do uso de armas, embora uma proporção relativamente pequena de indivíduos tenha relatado possuir ou já ter usado armas de fogo. As mulheres apresentaram atitudes menos favoráveis em relação às armas de fogo, mas mais de 701 TP3T de todas as entrevistadas relataram apoiar a posse e o uso de armas.
“Sabemos como as armas contribuem para a construção simbólica da masculinidade tradicional”, disse Tatiana Moura, diretora executiva do Instituto Equimundo. “Uma arma em casa aumenta muito a probabilidade de assassinato – ou ameaças violentas – da companheira de um homem. No entanto, não podemos encarar esse problema apenas como uma questão doméstica. Tem tudo a ver com nossas políticas públicas – por exemplo, as discussões em torno do Estatuto do Desarmamento no Brasil, que está sendo atacado, mas não pode sofrer retrocessos.”
O estudo também analisou o medo de violência dos entrevistados. Uma alta porcentagem de entrevistados relatou medo da polícia (59% no Norte; 53% no Sul), da milícia (53% no Norte; 44% no Sul) e de traficantes e traficantes de drogas (58% no Norte; 42% no Sul). Entre os entrevistados, no entanto, o medo de assaltantes foi o maior (78% no Norte; 47% no Sul).
Fatores que reduzem a violência
Enquanto as pesquisas quantitativas domiciliares do estudo foram conduzidas com homens e mulheres locais de diferentes áreas do Rio de Janeiro, as 45 entrevistas qualitativas se concentraram em homens e famílias — incluindo ex-traficantes de drogas, policiais, ativistas e seus parceiros — que escolheram trajetórias de não violência em meio a grupos nos quais são encorajados a usar a violência.
A paternidade emergiu como um fator central no direcionamento da trajetória de vida de um homem para longe da violência e em direção à não violência. Outros fatores associados a trajetórias não violentas incluíram: participação masculina em tarefas domésticas; conexão com círculos de apoio social; nível educacional; uso de mecanismos para "esfriar a cabeça" e se afastar de conflitos; perspectivas de vida mais amplas e maior mobilidade urbana; características individuais como habilidades emocionais e pró-sociais, resiliência e motivação; e rejeição de normas masculinas vinculadas à violência e a adoção de atitudes e comportamentos mais equitativos em termos de gênero.
O relatório também aponta para a necessidade de adotar uma nova agenda de segurança pública que trabalhe para construir cidades mais seguras e inclusivas. Os tomadores de decisão devem adotar políticas que superem o modelo policial atual do Brasil e, em vez disso, priorizem a prevenção da violência e a mediação de conflitos de forma mais ampla.
“Precisamos ir além da punição de indivíduos. Vimos que esse tipo de política não resolve o problema; além disso, não dá uma segunda chance a jovens e adultos. Acreditamos na resiliência, em atitudes positivas e em mudanças de paradigma”, disse Tatiana Moura. “Criar políticas de segurança pública integradas, que funcionem tanto no espaço público quanto no privado, é um avanço importante.”
Leia o relatório completo aqui.